RETRATAÇÃO NOS CRIMES CONTRA A HONRA COMETIDOS POR MEIOS DE COMUNICAÇÃO

Conteúdo do Artigo: 

Autor: Eduardo Luiz Santos Cabette, Delegado de Polícia aposentado, Parecerista e Consultor Jurídico, Mestre em Direito Social, Pós – graduado em Direito Penal e Criminologia, Professor de Direito Penal, Processo Penal, Criminologia, Medicina Legal e Legislação Penal e Processual Penal Especial na graduação e na pós – graduação do Unisal e Membro do Grupo de Pesquisa de Ética e Direitos Fundamentais do Programa de Mestrado do Unisal.

 

Retratar-se significa desdizer-se, declarar que errou, retirar o que disse, sendo causa de extinção de punibilidade nos termos do artigo 107, VI, CP.      Porém, a retratação não é aplicável a todo e qualquer caso de crime contra a honra. Em primeiro lugar ela só se aplica aos casos de ação penal privada, já que o artigo 143 menciona a palavra “querelado”.[1] A retratação também só se aplica à calúnia e à difamação. Não tem cabimento na injúria, uma vez que esta atinge a honra subjetiva primordialmente, de maneira que a retratação não teria o condão de reparar o mal ocasionado. Nos casos de calúnia e difamação que têm como objeto a honra objetiva, a retratação pode ocasionar um efeito reparador da reputação da vítima no seio social.

          Havendo coautores, a retratação de um deles não aproveita aos outros, pois que se trata de ato personalíssimo. Ademais, ela deve ser cabal, completa, não servindo a parcial ou condicional.

A retratação não depende de aceitação do ofendido em regra. Entretanto, a Lei 13.188/15 acrescentou um Parágrafo Único ao artigo 143, CP, de modo que nos casos em que a calúnia ou difamação forem praticadas por meios de comunicação, a retratação deverá ser feita também pelos mesmos meios, se assim o desejar o ofendido. Desse modo, nessas situações específicas, a retratação somente gerará efeitos se o ofendido a aceitar no que se refere à sua forma. Se a retratação é feita de outra maneira, que não pelos meios de comunicação e o ofendido exige isso, não terá validade. Pode-se dizer que, não quanto ao conteúdo, cuja análise e avaliação caberá ao magistrado, mas quanto à forma da retratação, nestes casos especiais, ficará ao alvedrio do ofendido a possibilidade ou não do instituto em estudo gerar o efeito da exclusão de punibilidade.

Leciona Bitencourt que nesses casos (crime cometido por meios de comunicação) a retratação passa a depender do “consentimento da vítima”, não maisdecorrendo “automaticamente da vontade e manifestação do ofensor”. Explica o autor que a retratação até poderá acontecer de fato, “mas somente produzirá seus efeitos penais se for precedida da aquiescência do ofendido”, além de que necessitará ser realizada pelos mesmos meios da prática da ofensa, desde que o exija o vitimado.[2]

Portanto, não vale mais o ensinamento constante na doutrina anteriormente ao advento da reforma procedida pela Lei 13.188/15, de que a retratação não dependia, invariavelmente, da aceitação do ofendido. [3] Autores que, como Pedroso, afirmam em edições já posteriores à Lei 13.188/15, que “a retratação tem natureza unilateral e, destarte, independe da aceitação do ofendido”, sem qualquer ponderação acerca do novo Parágrafo Único do artigo 143, CP[4] precisam atualizar seus textos, pois que tal alegação tem cabimento apenas parcial na atualidade, ou seja, quando o crime não for perpetrado por meio de comunicação.

Corretamente ensina Greco:

Em 11 de novembro de 2015, foi publicada a Lei n. 13.188, que dispôs sobre o direito de resposta ou retificação do ofendido em matéria divulgada, publicada ou transmitida por veículo de comunicação social, inserindo um parágrafo único no art. 143 do Código Penal, que diz que nos casos em que o querelado tenha praticado a calúnia ou a difamação utilizando-se de meios de comunicação, a retratação dar-se-á, se assim o desejar o ofendido, pelos mesmos meios em que se praticou a ofensa.

Aqui, portanto, caso a calúnia ou a difamação tenham sido cometidas através de meios de comunicação, para que a retratação do querelado produza os efeitos previstos no caput do art. 143 do diploma repressivo, ou seja, para que conduza à isenção de pena, com a consequente extinção de punibilidade, nos termos do art. 107, VI, do mesmo estatuto penal, se for da vontade do ofendido, deverá ser levada a efeito pelos mesmos meios em que se praticou a ofensa. [5]

O autor em destaque ainda chama a atenção para o fato de que a retratação deverá dar-se de acordo com a proporcionalidade exigida no regramento do “Direito de Resposta”, conforme delineado nos artigos 2º. e 4º. da Lei 13.188/15, sempre que o exigir o ofendido. [6]

No mesmo sentido se manifesta Nucci, aclarando ainda mais a questão:

Em suma, ofensas à honra objetiva (calúnia e difamação), se realizadas por qualquer meio de comunicação (TV, rádio, jornais, revistas, Internet etc.), em caso de retratação do agressor, há de se consultar a vítima, intimando-a, se processo houver, para exercer a sua opção: retratação pública ou nos autos do processo. Antes dessa opção, o juiz não pode declarar extinta a punibilidade. Por óbvio, a retratação pública deve circunscrever-se aos mesmos meios de comunicação em que foi proferida inicialmente, sob pena de se tornar inviável ao ofensor voltar atrás naquilo que falou. Assim sendo,se correu em determinado artigo no jornal X, ali deve ser realizada a retratação. Se outros meios de comunicação, retirando os dados do artigo, tambémo divulgaram, não fica o ofensor obrigado a retratar-se  em todos eles. Caberá, posteriormente, à vítima, assim querendo, transmitir a retratação a outros veículos de comunicação. [7]

Também esclarece Nucci que a realização da retratação pelos meios de comunicação em que foi feita a ofensa não é “condição inafastável”, já que a lei claramente cria uma opção para a pessoa ofendida, a qual, eventualmente, poderá “entender que, quanto maior divulgação tiver o fato, maior prejuízo lhe poderá ocorrer”.[8]

Enfim, após a alteração procedida no artigo 143, CP pela Lei 13.188/15 a questão da aceitação do ofendido quanto à retratação do ofensor tem duas possibilidades:

a)Se a ofensa não se deu por meios de comunicação, a retratação não depende da aceitação do ofendido.

b)Se a ofensa se deu por meios de comunicação, a retratação somente surtirá efeitos se o ofendido a acatar somente nos autos (concordar que ela seja assim feita) ou cumprida sua exigência de que seja procedida pelos meios de comunicação, tal qual o foi a ofensa. Nessa situação a retratação dependerá sempre de uma deliberação ou escolha do ofendido quanto à forma pela qual será feita. Não se pode, assim, afirmar que nos casos de ofensas feitas pelos meios de comunicação a retratação independa de aceitação do ofendido, ao menos quanto à forma pela qual se procederá.

REFERÊNCIAS

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. Volume 2. 16ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2016.

 

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. Volume 2. 15ª. ed. Niterói: Impetus, 2018.

 

MIRABETE, Julio Fabbrini, FABBRINI, Renato N. Manual de Direito Penal. Volume II. 31ª. ed. São Paulo: Atlas, 2014.

 

NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de Direito Penal. Volume 2. Rio de Janeiro: Forense, 2017.

 

PEDROSO, Fernando de Almeida. Direito Penal Parte Espcial. 2ª. ed. Leme: J H Mizuno, 2017.

 

 

[1]Em contrário, praticamente de forma isolada, se manifesta Bitencourt pelo cabimento da retratação em crimes contra a honra processados por ação penal pública, ainda que em interpretação “contra legem”. Cf. BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. Volume 2. 16ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 419 – 420.

[2] Op. Cit., p. 417.

[3] Cf. MIRABETE, Julio Fabbrini, FABBRINI, Renato N. Manual de Direito Penal. Volume II. 31ª. ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 149. A doutrina era então peremptória em afirmar que a retratação nunca dependia de aceitação do ofendido.

[4] PEDROSO, Fernando de Almeida. Direito Penal Parte Espcial. 2ª. ed. Leme: J H Mizuno, 2017, p. 382.

[5] GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. Volume 2. 15ª. ed. Niterói: Impetus, 2018, p. 394.

[6] Op. Cit., p. 394 – 396.

[7] NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de Direito Penal. Volume 2. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 240.

[8] Op. Cit., p. 240.