JUSTIÇA RECONHECE QUE HIDRELÉTRICAS DO RIO MADEIRA NÃO CAUSARAM IMPACTOS À ATIVIDADE PESQUEIRA E NEGA INDENIZAÇÃO A PESCADORES DE RONDÔNIA

Disputa na Justiça se arrasta há quase 10 anos. Cerca de 2000 pessoas reclamam indenizações de aproximadamente 5 salários mínimos mensais

A Justiça de Rondônia negou recentemente indenização a pescadores de Porto Velho que alegam ter sido afetados pela construção das hidrelétricas Santo Antônio e Jirau, no Rio Madeira.

 

O Tribunal de Justiça de Rondônia tem registro de mais de 200 processos propostos por cerca de 2000 pessoas que reclamam indenizações de aproximadamente 5 salários mínimos mensais, sob o argumento de que, desde que teve início a construção dos empreendimentos, em meados de 2008, a produção pesqueira teria diminuído e, em função disso, os pescadores da região teriam sofrido redução em seus ganhos com a atividade.

 

Os representantes das hidrelétricas negam qualquer impacto sobre a atividade pesqueira e indicam diversos motivos que estariam a influenciar a produção pesqueira e que têm ocorrido desde muitos anos antes do início da construção das hidrelétricas, por exemplo, a pesca predatória, o aumento da exploração pesqueira em virtude do crescimento do número de pescadores, fatores climáticos, etc. Além disso, alegam estar cumprindo todas as exigências ambientais impostas pelo IBAMA, especialmente a implantação de dispositivos que permitem a migração de peixes, dentre os quais se destacam os grandes bagres da Amazônia. “A sentença atesta que as usinas têm desenvolvido inúmeros programas ambientais de monitoramento e apoio à pesca na região e que cumprem as exigências impostas pelo IBAMA, sobretudo em relação aos equipamentos que permitem a transposição dos peixes pelas barragens e que viabilizam a migração dos cardumes”, analisa o advogado da hidrelétrica Jirau, Philippe Ambrosio Castro e Silva, sócio do escritório Giamundo Neto.

 

As hidrelétricas passaram a ser acionadas pelos ribeirinhos em 2011 e somente agora, passados 8 anos, os processos começam a ser sentenciados. A demora na conclusão dos processos é consequência da grande quantidade de provas técnicas, que exigem uma análise prolongada do meio ambiente por alguns anos.

 

Além disso, verificou-se que a tramitação dos processos foi comprometida pela realização de uma perícia irregular e que veio a ser anulada por “por falta de credibilidade e (...) inautenticidade, decorrente de plágio, bem como inclusão de dados inverídicos e desconexos da realidade”, conforme pontuado na sentença do juiz Jorge Luiz dos Santos Leal, da 1ª Vara Cível de Porto Velho.

 

Em relação à discussão travada entre os pescadores e as hidrelétricas, Jorge Luiz dos Santos Leal afirmou em sua sentença que “não há, de fato, conclusão efetiva e inequívoca de que as requeridas ou qualquer delas, por meio dos empreendimentos hidroenergéticos das quais são titulares, foram diretamente responsáveis pela variação da disponibilidade de espécies de peixes no Rio Madeira.” O magistrado ainda apontou que as hidrelétricas “adotaram medidas e desenvolveram programas ambientais visando neutralizar o impacto produzido sobre a fauna aquática”.


 

Na análise de Castro e Silva, um ponto importantíssimo reconhecido pela sentença é o fato de que os pescadores não possuem direito subjetivo nem garantia de pescar uma determinada quantidade de peixe por mês, o que inviabiliza o tipo de indenização pedida pelos autores da ação, sobretudo em meio às provas de que as hidrelétricas não causaram qualquer impacto sobre a pesca.

 

A sentença ainda faz uma análise técnica das possíveis causas do comprometimento da atividade pesqueira na região e aponta que “a pesca no Rio Madeira sofre com grandes oscilações ao longo das décadas”, o que é demonstrado pelo fato de que “desde a década de 90 até 2007 apresentou variações de 491 a 1.487 toneladas”. Esse dado permitiu ao juiz concluir que a diminuição na produção pesqueira na região é natural, sendo um fenômeno observado “antes mesmo da existência e instalação das Usinas Hidrelétricas”. Santos Leal ainda narrou que“segundo informações colhidas junto aos próprios pescadores, as variações estão relacionadas a fatores ambientais, comportamento ecológico das espécies, variações no esforço de pesca e aumento da fiscalização ou, até mesmo, ausência de parte dos registros.”

 

A confirmar que as reduções e aumentos da produção de pescado são parte de um fenômeno natural da região, Santos Leal utilizou em sua sentença dados de produção levantados desde o início da construção das hidrelétricas, em meados de 2008, os quais indicam que, naquela época, a região passava por um ciclo de diminuição da produção pesqueira. Esse ciclo, porém, foi substituído gradativamente por uma fase de crescimento da produção de peixes, o que foi visto em diversas regiões do Rio Madeira, tanto abaixo quanto acima das barragens. Chama atenção, por exemplo, a informação que consta na sentença de que “a produção pesqueira aumentou mais de 16 (dezesseis) vezes entre 2010 e 2016” no Distrito de Abunã, localizado a montante (rio acima) de onde estão instaladas as usinas.

 

Além de analisar o contexto da produção pesqueira na região, Santos Leal ainda descreveu em sua sentença que, dentre as 10 pessoas que são autoras do processo por ele julgado, muitos sequer eram pescadores antes da construção das hidrelétricas ou até mesmo jamais o foram. Outros, por sua vez, apresentaram documentos que, ao invés de atestar a queda, demonstraram crescimento da produção pesqueira, incompatível, portanto, com a alegação de prejuízos imputados pelos pescadores às hidrelétricas.

 

Ao final, além de concluir que as usinas hidrelétricas não prejudicaram a pesca na região e que os pescadores atualmente têm experimentado crescimento na produção pesqueira, Santos Leal concluiu “não ser razoável compelir as empresas requeridas ao pagamento de indenização tendo por parâmetro quanto cada pescador pescou em determinado período, tendo em conta inexistir no ordenamento jurídico qualquer norma em que cada pescador teria direito a pesca de uma quantidade ou espécie de peixe”.

 

Os pescadores ainda poderão recorrer contra a sentença, o que indica que a disputa ainda está longe de um final.


 

 

 

Tatiana Diniz

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